Manifesto dos presos políticos do Rio de Janeiro.

A todos os que lutam pela Anistia e pelos Direitos Humanos

(da obra de Gilney A Viana e Perly Cipriano, Fome de Liberdade – Relato dos Presos Políticos.)

O regime acaba de dar à luz seu projeto de Anistia Parcial e Restrita. Começam agora os rituais para que ele seja imposto à Nação.

Nunca um projeto de Anistia no Brasil foi tão contraditório, falho e aquém das aspirações da sociedade e do momento político que atravessamos.

Nunca um projeto de Anistia em nosso país foi tão eivado de absurdos e irregularidades jurídicas, e de tanta injustiça.

Nunca um projeto de Anistia foi tão emoldurado com diatribes ideológicas e estigmatizações sobre aqueles que dele foram excluídos, e tão casuístico que tornou praticamente nominais suas exclusões.

Nunca um projeto de Anistia foi tão usado para objetivos de propaganda, na tentativa de negócios com os interesses do povo, e servir a interesses espúrios por parte do regime.

Em função dessas razões, e enquanto opositores do regime, colocados à margem dessa Anistia, queremos deixar clara nossa posição:

– reconhecemos que essa Anistia atingirá uma parcela dos opositores do regime, mas não creditamos isso a uma benesse do poder e menos ainda que isso repare os danos aos mesmos, já que jamais deveriam ter sido perseguidos e alijados da vida política nacional;

– que essa Anistia, anunciada agora, não satisfaz aos reais interesses do povo brasileiro, assim como qualquer outro projeto que não seja amplo, geral e irrestrito;

– porque esse projeto pretende acobertar os crimes cometidos pela ditadura militar, anistiando aqueles que torturaram, assassinaram prisioneiros indefesos, e seus mandantes, tentando impossibilitar a apuração desses crimes e a devida responsabilização dos envolvidos.

– porque esse projeto de Anistia parcial em sua essência é parte de um projeto maior de perpetuação desse regime;

– porque achamos que a luta pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita se confunde com a própria luta pela democratização do país, constituindo-se numa das bases deste processo;

-declaramos que somos opositores que ousaram levar a luta políticas ao nível da luta armada contra esse regime, e repudiamos qualquer medida que nos exclua da vida política nacional;

Rejeitamos taxativamente a clemência do poder, já aventada através de indulto presidencial, e a denunciamos não como um reparo à reconhecida injustiça de nossa exclusão, mas como um atentado à nossa dignidade, da qual jamais abriremos mão, mesmo que isso venha nos custar mais anos de cárcere.

Conclamamos a todos os brasileiros que amam a liberdade, e que não compactuaram com os crimes da ditadura militar nem com sujas manobras continuistas, a se manifestarem, sob as formas possíveis ao seu alcance, pela Anistia Ampla, Geral E Irrestrita, que marcará um significativo avanço para se por fim a este regime de terror, a estabelecer um regime democrático que expresse a vontade e a participação do povo.

Desde já nos comprometemos com todos os setores sociais populares a dar conseqüência à luta até a conquista da Anistia, Geral e Irrestrita.

Os presos políticos.

Presídio Político do Rio de Janeiro, 29 de junho de 1979.

Alex Polari de Alverga, Antonio Pereira Mattos, Carlos Alberto Sales, Gilney Amorim Viana, Hélio da Silva, Jesus Parede Soto, Jorge Raimundo Jr., Jorge Santos Odria, José André Borges, José Roberto Gonçalves de Rezende, Manoel Henrique Ferreira, Nelson Rodrigues, Paulo Henrique Oliveira da Rocha Lins, Paulo Roberto Jabur, Perly Cipriano.
E pouco mais adiante dizem: “A esta altura já tínhamos tomado a decisão de fazer a Greve de Fome, da qual já tinham conhecimento os movimentos pela Anistia, alguns parlamentares de oposição, lideranças sindicais e comunitárias, com as quais procurávamos uma atuação conjunta nesta nova etapa da luta pela Anistia. Mas ainda não tínhamos definido a data de início e outros detalhes táticos e organizativos que normalmente devem ser previstos antecipadamente, em movimentos desta natureza”.

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