Na primeira vez em que Luiz Eduardo Greenhalgh me procurou para conversar sobre a campanha pela Anistia eu me lembro bem de que argumentei mais ou menos na seguinte linha: nossa preocupação era com as maiorias, com a classe trabalhadora, mais do que com a situação de um conjunto restrito, como o dos presos políticos, dos exilados ou dos cassados.

Daí para a frente nossa consciência política felizmente foi avançando. E as mobilizações pela Anistia jogaram um importante papel nessa direção. Aos poucos, o tema foi se tornando pauta obrigatória de qualquer encontro sindical que a gente passou a realizar cada vez mais freqüentemente nos últimos anos da década de 70.

Durante um encontro entre várias categorias, em Gragoatá, Niterói, decidimos fazer uma visita aos presos políticos do Rio de Janeiro. Fomos, o Olívio Dutra, eu e vários sindicalistas. Lá no presídio estivemos com os companheiros Perly Cipriano, Gilney Amorim Viana, Nelson Rodrigues Filho, Jesus Paredes Soto e outros que não me lembro agora.

Nesses debates sindicais acabava sempre acontecendo uma votação entre duas posições. Uma, era incluir nos nossos documentos a defesa da Anistia, sem nenhum adjetivo, que era o argumento do pessoal mais cauteloso. Outra, era a "Anistia Ampla, Geral e Irrestrita", em que a gente votava e acabava vencendo.

Lembro-me, também, e isso não deve ser esquecido agora, do papel importante do Teotônio Vilela naquele momento. Mesmo vindo da Arena, tornou-se, como senador, uma das mais importantes figuras públicas na defesa da bandeira.

Na chegada ao Brasil do companheiro Manoel da Conceição, o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, que eu presidia na época, preparou uma manifestação no aeroporto, com bastante gente, bandeiras, uma festa.

Mas a verdade é que, em agosto de 1979, quando a Anistia foi aprovada, nosso sentimento foi de frustração. Era parcial, restrita, cheia de armadilhas, como a questão dos "crimes conexos", que as forças governistas e conservadoras de um modo geral passaram a interpretar como Anistia recíproca. A Anistia para valer só veio mesmo quando da promulgação da Carta de 1988, junto com aquele discurso bonito do Dr. Ulisses.

Olhando a partir de hoje, fica uma impressão de processo incompleto, algo que precisa ser retomado e levado adiante com mais profundidade. Mistérios como o de Rubem Paiva, que o Dr. Ulisses lembrou no discurso, precisam ser esclarecidos. Só tendo um conhecimento profundo sobre tudo o que se passou nos porões da repressão naqueles anos o Brasil conseguirá se proteger de verdade contra a repetição de um período tão tenebroso de nossa história.

 

*Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, preso e condenado em 1978.

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