A nossos filhos

Carta-compromisso da Comissão de Mães em Defesa dos Direitos Humanos de São Paulo, na data de sua criação.

Ao longo de sua infância e adolescência, procuramos transmitir-lhes conceitos fundamentais sobre a pessoa humana e sobre a vida em sociedade.

Ensinamos que a convivência entre os homens requer respeito e compreensão, para que divergências não levem as pessoas a se tratarem como inimigos e para que o confronto de idéias não se faça com recurso à violência.

Nunca admitimos que os direitos humanos fossem dádiva ou concessão de Estados e de governos.

Sempre reconhecemos ser direito e dever de vocês participar da vida nacional, como estudantes e cidadãos, de forma pacífica e ordenada, até mesmo para que a firmeza de suas convicções não viesse servir a propósitos radicalizantes.

Procuramos, assim, entregar à Nação homens e mulheres de coragem e civismo.

Com o acesso aos Cursos Superiores, vocês aprofundaram esses conceitos, buscando no estudo, na reflexão, nas disputas e manifestações inerentes às atividades universitárias, o imprescindível contato com as diversas correntes do pensamento e com as várias expressões culturais de todos os tempos.

Todos vocês, em breve, estarão no exercício das diferentes profissões de interesse da cultura, do progresso, do ensino, da justiça e da saúde do povo brasileiro.

Portanto, vocês já não necessitam da nossa ou de qualquer tutela, embora nossos vínculos de profundo amor continuem permanentes.
Desejamos que vocês nos superem em ardor, vitalidade, coragem e idealismo.

Muitas vezes vocês, nós, o povo inteiro, temos sido, como aconteceu recentemente, traumatizados por atitudes arbitrárias que afetam a todos.
Por isso vocês, em manifestações ordeiras e pacíficas, percorreram desarmados as ruas de São Paulo .

Um imenso esquema de repressão policial foi mobilizado, com os mais sofisticados apetrechos. Cavalos e cães, prontos para o ataque, ameaçavam reeditar na Capital Paulista, em pleno 1977, as cenas da arena romana ou os métodos dos caçadores de escravos.

Vocês se portaram à altura de sua responsabilidade, não se curvando à restrição de seus direitos e não aceitando as inúmeras provocações.
A sua luta é pela LIBERDADE, por um regime absolutamente democrático.
Nesta hora, reiteramos nossa solidariedade e confiança em vocês pois, tal como seus mestres, rejeitamos "a cumplicidade passiva do silêncio".

São Paulo, junho de 1977

`