Publicado originalmente em 13/12/1998

Se neste momento solene
Não lhes proponho um feriado comemorativo
Da sacrossanta glória da burrice nacional
É porque, todos os dias,
Graças a Deus,
Do Oiapoque ao Chuí,
Ela já é gloriosamente festejada
.

(Tom Zé, na música "Burrice Nacional", 1968)

 

 

Previsão do tempo:
Tempo negro.
Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos. Máx.: 38º, em Brasília.Mín.:5º, nas Laranjeiras

(Publicado no Jornal do Brasil, no dia seguinte à decretação do AI-5)

 

 

Esta anticomemoração  que a Fundação Perseu Abramo realiza é uma forma de lembrarmos os 30 anos do Ato Institucional nº 5, decretado em 13 de dezembro de 1968. Com ela, pretendemos não deixar passar em branco nosso repúdio a este ato e ao que ele representou como agressão à democracia, ao Brasil e ao seu povo.

O Ato Institucional nº 5 (AI-5) acentuou o caráter ditatorial do governo militar instalado em 1964 no Brasil. Com ele, o Congresso Nacional e as Assembléias Legislativas estaduais foram colocados em recesso, e o presidente, à época o general Costa e Silva, passou a ter plenos poderes para cassar mandatos eletivos, suspender direitos políticos, demitir ou aposentar juízes e outros funcionários públicos, suspender o habeas-corpus em crimes contra a segurança nacional, legislar por decreto, julgar crimes políticos em tribunais militares, dentre outras medidas autoritárias. Paralelamente, nos porões do regime, generalizava-se o uso da tortura, do assassinato e de outros desmandos. Tudo em nome da "segurança nacional".

Mas, sobretudo, o AI-5 atingiu o que restava de esperança de mudar o Brasil, fazê-lo voltar ao caminho democrático, após o desvio de rota causado pelo golpe de 1964. Nos depoimentos que recolhemos para esta anticomemoração, fica muito evidente esta conseqüência do Ato 5, que levou muitos dos jovens que se empenhavam na oposição ao regime militar a optarem pela luta armada.

Outro ponto importante a ser ressaltado – e que é lembrado em mais de um depoimento – é o fato de muitos dos personagens que participaram da decretação do regime de exceção, ou dele foram beneficiários, hoje posarem de democratas radicais, lutadores contra o autoritarismo. Alguns só faltam dizer que foram perseguidos pelo regime militar, quando na verdade foram seus instrumentos. Outro é o caso daqueles que foram efetivamente punidos pelo AI-5, e hoje dão as mãos – e quem sabe mais o quê – aos seus antigos algozes. Estes escolheram um novo rumo para suas vidas.

Esperamos que os depoimentos aqui reunidos sirvam, para aqueles que viveram e sofreram com Ato 5, como forma de recuperação daquele passado, para que nosso país não venha a repeti-lo, seja por que pretexto for; para aqueles que não viveram os anos duros do regime militar, que sirvam para que conheçam um momento particularmente importante da nossa história, que valeu, pelo menos, para que muitos brasileiros dessem provas de um espírito de luta em favor da liberdade e da justiça como poucas vezes se viu.

 


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