Mais do que um hábito, o uso indiscriminado de abreviar já se tornou um vício. Do qual as pessoas não conseguem furtar-se tão facilmente. É bem verdade que a sigla, a abreviatura, não são coisas recentes. Uma das mais difundidas é INRI, e aposto que muita gente não sabe o que significa. Depois da primeira grande guerra uma sigla se tornou famosa: SDN, da mesma forma que hoje não menos famosas são três outras abreviaturas, que comportam variações conforme o idioma em que são escritas; EUA, ou USA, ou US; URSS; ONU ou UNO ou UN.

 

Houve um tempo em que abreviar era mais próprio da correspondência comercial ou burocrática. Jamais consegui conformar-me com esses três mosqueteiros da epistolografia comercial abreviada: amos, atos, obdos. Como também não consigo deixar de achar um trocadilho de mau-gosto o P. Deferimento do fim dos requerimentos.

Algumas abreviaturas tornaram-se célebres tanto pela coisa que nominam, quanto pela facilidade com que são pronunciadas. Ou pela sua dificuldade. Estão nesse caso FDR, IKE, K, e toda a série de jotas: G, K, Q, M. Há também as siglas explosivas: TNT, BA, BH. Há as que saíram de moda: GI. E há as que voltarão à moda: SPQR, o que acho improvável.

O que acho reprovável é a ameaça de trocadilhar siglas, ou seja de aproveitar a inocência das abreviaturas para caluniar as entidades que são por elas representadas. Assim, já ouvi falar da iniqüidade da INIC, da inépcia do INEP. Contaram-me que uma delegação comercial italiana perguntou a um engenheiro brasileiro como ia a siderurgia nacional, e ele respondeu: cosi, cosipa. Quando apenas se iniciava em São Paulo a implantação do plano de energia elétrica, um vespertino publicou um dia uma berrante manchete, qualquer coisa como ?ameaçada de colapso a Sharp?. O jornal queria dizer CHERP, mas, incrédulo quanto às possibilidades de se fazer luz do capital brasileiro, optou pela grafia que julgou ser de uma empresa norte-americana.

Nem sempre a abreviatura diz bem da entidade que titula. O mais universal dos organismos, que representa mais ou menos dois bilhões de seres humanos, nomeia-se por uma abreviatura de duas letras: UN. E, no entanto, há em São Paulo uma associação que deve reunir no máximo alguns milhares de pessoas e tem uma abreviatura assaz desabreviada: APESNOESP (pronuncia-se apesnoesp).

Há abreviaturas despudoradas, que se prestam a nomear alhos e bugalhos. P. ex.: o ?Dicionário de Siglas? de A. P. Miléa registra para a abreviação IC os seguintes significados: Igreja Católica, Internacional Comunista, Imposto de Consumo e Instituto de Criminalística. MM, por outro lado, tanto pode ser Meretíssimo como Marilyn Monroe. Os publicitários franceses inventaram um segundo sentido para o BB de Brigitte Bardot: Beaucoup de Bonheur.

Sei que não seria fácil escrever e dizer Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, ou Centrais Elétricas de Urubupungá Sociedade Anônima ou Usinas Elétricas do Paranapanema. Mais fácil é dizer SUDENE, CELUSA, USELPA, mesmo que isso nos lembre nomes de mulheres longínquas e estrelas inatingíveis.

Acho, no entanto, que não devemos abusar das abreviaturas.

P. S. ? S. m. j.

 

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